Tudo que tentamos fazer em segurança pública parece pouco. A polícia prende, faz operações, morre, mata, investiga....E? Parece que nada muda. Às vezes, realmente parece que em segurança pública e políticas criminais nada funciona (nothing works).
Apesar de tantos esforços, políticas promissoras, boa vontade, discussões, programas e projetos, não existe um horizonte muito promissor. Os crimes continuam cada vez piores; quanto mais a polícia prende, mais criminosos surgem para serem presos; quanto mais se apreende drogas, mais pessoas existem para consumi-las. Quantos presídios construiremos? Até quando apenas cobraremos solução do governo, como se o problema não fosse nosso?
Talvez estejamos enxugando gelo. Talvez eu seja apenas um vendedor de fumaça.
No entanto, parece-me que somente quando cuidarmos de nossas crianças poderemos chegar a uma verdadeira solução. O caminho é longo, mas é a única verdadeira solução. O que vem sendo feito em segurança pública é necessário, mas enquanto a realidade e a sociedade são alteradas, melhoradas.
A segurança pública não é a solução para a nossa sociedade. É o remédio que nos faz sobreviver enquanto a cura é construída. Todos temos que construir. Não podemos apenas cobrar mais segurança e esperar. Uma nova sociedade é feita por todos nós.
Não é caso de polícia. E todos podem fazer alguma coisa, ensinar alguma coisa, colaborar com alguma coisa.
Deixo dois artigos de meu livro para reflexão:
FAMÍLIA E PAIS COMO PREVENÇÃO DA CRIMINALIDADE
Há algumas semanas falei sobre resultados encontrados em minha pesquisa sobre os fatores que contribuem para a criminalidade violenta de adolescentes e, especificamente, como a ausência paterna e a desestruturação familiar podem contribuir para que jovens se tornem delinquentes. Hoje retomo o tema para apresentar dados mais precisos e discutir o papel da família na prevenção da criminalidade.
Os resultados encontrados em minha pesquisa revelam que apenas 32% dos adolescentes que cometeram crimes violentos moram com os pais, enquanto que para os adolescentes não infratores o mesmo índice é de 72%. Da mesma forma, 42% dos adolescentes violentos tem 4 ou mais irmãos, sendo que apenas 20% dos adolescentes que não cometeram crimes têm família tão numerosa.
Na mesma esteira, quase 20% dos infratores violentos afirmaram que nunca almoçam ou jantam com os pais, enquanto apenas 5% dos não delinquentes fizeram a mesma assertiva. Outro dado revela ainda mais o afastamento que existe entre o adolescente infrator violento e seu pai: quase 1/3 deles não sabem se o pai trabalha ou não. Isso mesmo. Eles simplesmente não sabem dizer se sim ou não.
Estes são apenas alguns dados obtidos em minha pesquisa, os quais vão ao encontro dos resultados obtidos em outras pesquisas criminológicas similares e que já nos possibilitam inferir que a família, sua estrutura e a proximidade paterna têm alguma influência no cometimento de crimes por adolescentes.
Partindo destes estudos, podemos afirmar com certa margem probabilística que há uma tendência das famílias melhor estruturadas, onde existe afeto entre seus membros, em não verem seus filhos envolvidos no cometimento de crimes graves e violentos. A responsabilidade dos pais neste aspecto não pode ser minimizada, lembrando que o cometimento de crimes leves na adolescência é algo relativamente comum e passageiro, não despertando tanta preocupação. Falarei sobre isto em outra oportunidade.
De momento, passo a sugerir algumas atitudes para que as famílias reflitam e os pais passem a adotar para ajudar seus filhos a construírem vínculos sociais sólidos e que os afastem da criminalidade.
O primeiro passo é existir um planejamento familiar. Não podemos admitir que pessoas com dificuldades financeiras enormes tenham 5, 6, 7, 8 filhos. Isto é uma maldade com as crianças, com as famílias e com a sociedade. O afastamento nestas famílias é inevitável, as tensões geradas pelas dificuldades de sobrevivência estimulam a violência interpessoal e esta passa a ser vista como algo normal pela criança, o que poderá trazer reflexos no cometimento de crimes violentos na adolescência e na vida adulta.
É responsabilidade das escolas, dos governos, das igrejas, das associações de moradores e de todos nós (pais, amigos, vizinhos, patrões) uma orientação sexual para o planejamento familiar. A conscientização exige tempo, mas infelizmente é a única solução duradoura de longo prazo para questões de segurança pública.
Como me estendi um pouco neste primeiro aspecto da importância da família para a segurança pública e prevenção da criminalidade, continuarei a tratar deste tema no próximo artigo. Uma última reflexão: para ser pai é necessário respeito à vida e responsabilidade.
FAMÍLIA E PAIS COMO PREVENÇÃO DA CRIMINALIDADE - continuação
Continuando a reflexão sobre algumas atitudes que os pais devem adotar para ajudar a educar filhos para a não violência e para não vê-los envolvidos com a criminalidade, passamos a discutir a proximidade familiar.
O primeiro aspecto apresentado no artigo passado foi sobre a importância do planejamento familiar, pois este propiciará a formação de famílias estruturadas, onde exista correlação entre as condições financeiras, de sobrevivência digna e o número de membros desta unidade familiar.
Quem ganha um salário mínimo não pode sonhar em ter 10 filhos. Antes de realizar este sonho deve-se pensar em ganhar mais, pois só assim poderá dar uma vida digna a seus filhos. Feliz ou infelizmente – deixo este julgamento a cargo do leitor – este é o mundo capitalista em que vivemos e temos que aprender a viver nele com dignidade e respeito à vida e ao ser humano. Ademais, deve-se aceitar que atualmente a população é eminentemente urbana, não se justificando mais o pensamento de que uma família numerosa tem maior força de trabalho no campo.
Orientação às pessoas mais pobres e conscientização são inafastáveis se quisermos progredir como sociedade organizada. Segurança pública, pode-se perceber, não é simplesmente prender bandidos. É algo bem mais complexo e difícil de tratar.
Ultrapassado este primeiro aspecto, devemos refletir sobre proximidade e união dentro das famílias. O afastamento familiar hoje é uma realidade e não pode ser minimizado em nenhum aspecto. Pais não sabem de filhos e filhos não sabem de pais. Muitas vezes – não é apenas uma expressão não, foram diversas vezes mesmo – levei crianças de 10, 11 anos para casa porque estavam nas ruas (perto de bares, bailões e pontos de venda de drogas) de madrugada. O que fazer nestes casos? Dizer aos pais que amem seus filhos? Criar um Conselho Tutelar gigantesco para conseguir acompanhar todos os casos? Retirar estas crianças dos pais e deixá-las abandonadas em orfanatos?
Conforme falei: orientação sexual, educação e conscientização. Difícil e demorado, mas a única solução duradoura para a segurança pública. Apenas repressão jamais será suficiente se o contingente de possíveis criminosos não para de crescer e se a criminalidade encontra jovens com fatores tão propícios para delinquir.
Se você tem condições de compreensão e estrutura suficiente para começar, não espere. Comece dentro da sua própria casa. Unir a família, com os diálogos de segurança pública, como já falado em outros artigos, conhecer e aproximar-se de seus filhos, orientá-los sobre como evitar drogas, más companhias, uma gravidez precoce, uma doença sexualmente transmissível, são indispensáveis. Um constrangimento para começar estas conversas, principalmente quando elas nunca existiram, é normal, mas aproveite este artigo para introduzir e iniciar o assunto. “Hoje li um artigo que falava sobre….”.
Acompanhamento das atividades, companhias e amigos do seu filho não são motivos de vergonha ou excesso de proteção, mas atenção necessária no mundo de hoje. Observe-se que em momento algum defendo a família tradicionalista e rigidamente estruturada. Pelo contrário, defendo a família livre, baseada no afeto e na busca da felicidade de seus membros. Divórcios, por exemplo, são comuns e válidos quando o que une a família é o amor e a busca da felicidade. Nenhuma união deve continuar pela simples tradição ou obrigatoriedade um dia assumida. Mas família é muito mais do que isso.
Além do mais, preocupação e educação dos filhos não exige cobrança e pressão, mas cumplicidade e respeito. Educação racional, sólida, direta, objetiva e baseada em responsabilidade. Em última instância, quem decidirá será sempre seu filho, mas ele saberá escolher.
A figura paterna presente em uma família funciona como uma coluna um edifício. Sendo de grande importância para a sustentação desta unidade.
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