sábado, 27 de julho de 2013

TRAGÉDIA E MEDO - Por Rafael F. Vianna


Às vezes dá medo viver! Não por nós propriamente dito, mas por aqueles que amamos, pelos pequenos que ainda não conhecem nada da vida, que são puros, indefesos, cheios de bondade.

Como podemos colocar crianças em um mundo deste? Como não ter medo de nossos entes queridos que andam desprotegidos pelas ruas, em um mundo onde as trevas espreitam para retirar-lhes a vida, sem piedade ou chance de negociação?

Quando não são criminosos, são policiais, quando não são esses é o destino, as moiras cruéis e implacáveis, o acaso insondável que nos leva os que amamos.

Como explicar o destino? Como explicar as fatalidades da vida? Como explicar as tragédias e o medo que elas nos provocam? Como explicar que coisas ruins acontecem com pessoas boas? Como viver em um mundo sem explicações, onde a aleatoriedade, o acaso ou a fé precisam dominar nossa razão para continuarmos andando?

Por que Deus permite isso? Como é possível viver em um mundo de medos, que nos paralisam, nos levam do mundo, nos tiram de nós? É muita coisa para dar certo no mundo, muitos botões para um avião voar, muita sorte para continuarmos vivos.

Só vidas passadas podem explicar o destino, o lugar errado na hora errada, a bênção de alguns e a ruína de outros. Quem não acredita na reencarnação e no carma não pode pensar sobre o mundo. Seria atroz, desumano, insuportável.

Não existe volta para a tragédia! Não se apaga um crime, um tiro, uma morte. Não se apagam várias. Sempre pensamos que nada vai acontecer, que “não vai dar nada”, que somos protegidos, que temos sorte, que nossa vida é diferente. Até que o tiro impensado ocorre, que o incêndio inesperado acontece, que a tragédia improvável nos toca. Um dia a morte nos tocará. E neste dia nada que era para ser será como deveria ser.

Como não cultivar medos ilegítimos, mesmo sabendo que eles servem para aqueles que penetram em nossas inseguranças para nos vender substitutivos simbólicos?

Pergunto a Deus, como Vinícius de Moraes, se foi para desfazer por que é que fez? Deus é insondável, seus desígnios inexplicáveis, sua crença uma necessidade. Deus há de ser grande e misericordioso, mas minha razão não consegue alcançá-lo. Talvez porque Ele seja Deus…

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Textos - "Era só um cinema" e "Nojo de Gente: regras de convivência" - por Rafael F. Vianna


ERA SÓ UM CINEMA

Era para ser apenas uma tarde de cinema em um shopping de Curitiba. Pipoca, filme, sala não muito cheia. Tudo normal em uma bela tarde de domingo.
Aí, um senhor da fileira de trás, acompanhado de sua esposa e filha, solicita silêncio para outro senhor, sentado na minha fileira, mas distante umas cinco cadeiras, já que o cinema estava vazio. O senhor da minha fileira conversava com o filho adolescente durante o filme, mas nada que incomodasse muito.
De qualquer forma, cinema não é lugar de conversar e o pedido do homem de trás foi gentil e indiferente. Mas o senhor da minha fileira não encarou assim e virou falando:
- Você tá me mandando calar a boca? Quem você pensa que é? Quer levar porrada?
Que belo exemplo para o filho adolescente. Faz errado, atrapalha os outros e ainda acha que tem razão. Contudo, o senhor da fileira de trás não retrucou e apenas pediu para ele fazer silêncio e assistir ao filme tranquilo.
Não foi o suficiente. O valentão continuou chamando o senhor para irem lá fora resolver a pendenga. E eu? Apenas tentando assistir ao filme. Mas não ia terminar assim. Estava escrito! Tive que começar a me preparar para intervir. Coisa que não gostaria de fazer em um domingo, "de folga".
Mais dois ou três minutos e não deu outra: os dois se atracaram em uma briga dentro do cinema. Tive que levantar, gritar que era polícia, que os dois iriam em cana e que era para saírem imediatamente. Fui com os dois para fora da sala de cinema.
Mais discussão, explicações, ponderações e ficou acertado que iríamos voltar e assistir ao filme sem conversas e agressões. A outra opção era irmos todos para a Delegacia.
O restante do filme transcorreu sem incidentes, apesar da adrenalina e da tensão que tive que enfrentar em um momento que era para ser de descanso. Tem coisas que as pessoas e a mídia não entendem, mas um policial está sempre de serviço. Não consigo fingir que não vejo, que não é comigo. Não posso chamar a polícia para resolver. Afinal de contas, eu sou a polícia.
No final do filme teve mais. Os dois voltaram a ficar muito nervosos quando se encontraram do lado de fora. Filhos chorando, velhinhos chocados, seguranças do shopping a postos. Mais uma vez intervi e lhes expliquei que não existiria vencedor naquela disputa, apenas perdedores. Acataram as minhas sugestões e cada um foi para um lado. Um crime a menos. Mas o que esperar das pessoas?

NOJO DE GENTE: REGRAS DE CONVIVÊNCIA

Na semana passada contei sobre a briga que presenciei e tive que mediar em um cinema de Curitiba. Hoje, trago algumas regras de convivência que todos deveriam seguir para evitar transtornos ou inconvenientes com outras pessoas.
Às vezes penso que não precisaria abordar isso, mas quando vejo dois senhores, na presença de seus filhos adolescentes e de suas esposas, brigarem como se fossem cães de rua, tenho certeza de que o ser humano precisa ouvir coisas óbvias. Nem que seja para se lembrar de como é ridículo e degradante esquecermos coisas óbvias em nosso dia a dia.
Relembro que os senhores da briga no cinema não eram sem formação ou de um nível social baixo. E o cinema não era de periferia ou de nível ruim. Ao contrário, os senhores eram de meia idade, ricos e o cinema era no Batel.
Pois bem. Vamos às obviedades.
1ª regra de convivência social: seja sempre discreto.
Ninguém quer ouvir você falar alto, espirrar alto, arrotar, contar seus grandes feitos e conquistas, ver você agarrar sua mulher, seu parceiro, ou seja lá o que for, de forma acintosa.
2ª regra: evite a proximidade física com pessoas que você não conhece em um local público.
Isso quer dizer que se o cinema estiver vazio, você não deve sentar próximo às pessoas que chegaram antes de você. Respeite o espaço das pessoas e sempre que tiver opção não sente próximo ou na frente de quem já está lá.
3ª regra: não converse no cinema, não fale alto em hipótese alguma, nem ria alto, nem aborde uma pessoa que você não conhece na rua de forma incisiva. Seja pelo motivo que for.
4ª regra: quando você quiser beber muito, rir muito, cantar muito, chorar muito ou ouvir som alto, tranque-se no quarto com um fone de ouvido. Nunca escute som alto, nem no seu carro no sinal, nem no fone de ouvido no ônibus. Dependendo da altura do som, ele incomoda o passageiro ao lado. Música alta é só com fone de ouvido, mas também é no seu quarto. Nunca escute som alto em sua casa, pois provavelmente existirão vizinhos que têm todo direito de não gostarem ou não quererem ouvir a sua música naquele momento.
5ª regra: tenha vergonha de incomodar ou ser notado por outra pessoa em um local público. Tenha vergonha! Não ache ruim, pois ninguém quer saber de suas idiossincrasias. Lembre-se: seja sempre discreto.
Seria cômico ler essas regras se elas não estivessem em uma coluna de segurança, se não fossem escritas por alguém que pensa sobre a violência e a criminalidade, se não fosse realmente necessário dizer. Às vezes chego a entender um amigo que diz que tem nojo de gente.

domingo, 21 de julho de 2013

Professor Maurício Dieter lança livro

O professor Maurício Dieter, mestre e doutor pela Universidade Federal do Paraná e meu amigo de longa data, lançou seu primeiro livro: Política Criminal Atuarial - a criminologia do fim da história.
Recomendo a leitura de seu livro, pois Maurício Dieter possui ideais nobres e uma visão à frente de nosso tempo, além de ser uma das mentes mais privilegiadas que conheço. É um humanista e uma grande pessoa.
Abaixo mais algumas opiniões sobre o livro e um resumo do curriculum vitae do autor:
 
“O texto sintetiza extraordinário domínio teórico sobre a economização da Política Criminal e todos os seus tecnicismos com a defesa sincera e intransigente dos direitos humanos. Por isso, o livro de Maurício Dieter deve ser lido por todos os interessados:
- na realidade do sistema de justiça criminal;
- nas idéias sobre o possível futuro das estratégias de controle social;
- em trazer mais justiça para o que se chama hoje, equivocadamente, de sistema de justiça criminal”
Prof. Dr. Sebastian Sheere
Diretor do Institut fur Kriminologische Sozialforschung da Hamburg Universitat
“(...) o leitor tem em mãos um livro indispensável, que ajudará os operadores democráticos e progressistas do sistema penal a se unirem no repúdio a uma tendência que consolida o que houve de mais arbitrário, cínico e desumano na política criminal ocidental moderna.”
Prof. Dr. Nilo Batista
Professor titular de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Sobre o autor
Maurício Stegemann Dieter, Doutor e Mestre pela Universidade Federal do Paraná com estágio de pesquisa doutoral da Hamburg Universitat. É também Especialista em Direito Penal e Criminologia pelo Instituto de Criminologia e Política Criminal e pesquisador do Max-Planck-Institut fur auslandiches und internationales Strafrecht, em Freiburg.
Advogado criminalista, leciona direito Penal nos cursos de graduação em Direito da UniCuritiba e da Universidade de Passo Fundo e na Pós-Graduação do Instituto de Criminologia e Política Criminal, da Academia Brasileira de Direito Constitucional, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e dos cursos Jurídico e LFG. Membro do Instituto de Advogados do Paraná, atualmente cursa o Pós-doutorado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 

sábado, 6 de julho de 2013

NADA PIOR - por Rafael F. Vianna

Há algumas semanas estou tentando me convencer de que li corretamente uma notícia, que não foi apenas um sonho ruim, um erro ou uma brincadeira lançada na internet. Há algumas semanas estou carregando a angústia que uma coisa dessas pode causar em qualquer um que consiga parar e pensar sobre isso: um pai matou os três filhos pequenos porque não aguentava mais os ver passar fome. Depois esse pai tentou se matar, mas foi impedido por desconhecidos.
Não pode ser verdade uma notícia dessas! Ele matou os três filhos, enquanto os levava para a escola, porque os pequenos passavam fome e ele não aguentava mais ver isso. Por que será que ele não doou os filhos? Por que será que ele simplesmente não os abandonou? Por que será que as pessoas não deixaram ele se matar e acabar com tanto sofrimento? Por que ele não foi roubar? Será que pode existir miséria tão grande a ponto de um ser humano fazer isso?
Que orgulho, falta dele ou miséria podem fazer um pai escolher a morte ao invés da fome? Como podemos ir a restaurantes sabendo que pessoas não conseguem alimentar seus filhos? Como essas pessoas podem ter filhos? Parece que a miséria era extrema, parece que a dor e o sofrimento intermináveis, parece que essas pessoas não tinham mais nada.
Mas será possível alguém matar os próprios filhos para poupá-los da pobreza? Será essa sua real motivação? Será isso possível e justificável? Acho que não. Acho que esse pai não matou as crianças para livrá-las da fome, mas para livrar-se da humilhação e da dor. Acho que ele matou porque teve uma formação de caráter deturpada em razão da fome, das violências, das ausências. Acho que matou porque não pode aprender qual o valor da vida, porque não tinha mais forças para lutar a vida do submundo, porque não acreditava que seus filhos pudessem aguentar esta sobrevivência e só sobrevivência. Provavelmente matou porque não teve condições nutricionais suficientes para ter um cérebro que raciocinasse ou um coração que encontrasse um outro caminho. Matou porque a vida das crianças devia ser dura demais. O submundo tem outras regras, é outro mundo. Não conseguimos entender, ainda que minhas perguntas persistam.
Este pai não é inocente por certo, mas a verdade é que somos todos culpados, ainda que poucos sintam a culpa, sintam o fracasso que algo assim significa, a tragédia que transformamos a vida de alguns.
Poucos enxergam o que significa existir um pai que mata os filhos porque não aguenta mais ver suas crianças passarem fome. Poucos enxergam como falhamos como sociedade, Estado, segurança pública. Sinto um vazio dentro de mim quando leio isso, pois falhei por isso acontecer, falhamos por isso acontecer.
Se todos sentissem esse fracasso - ao invés de apenas apontar para um pobre coitado, condená-lo e achar que ele é o demônio consciente e encarnado - o mundo seria melhor. Mas na segurança pública o erro é sempre do outro; nunca nosso.
O pai confessou que foi vingança? Ficou provado que ele não matou em razão da miséria extrema em que vivia com as três pequenas vítimas, magrelas, desnutridas, de olhares inexistentes? Isso não muda nada. E ele não confessou dessa forma. A mãe não morava mais com eles e sozinho não tinha mais como mantê-los. Matou enquanto os levava à escola e os ouvia reclamar do estômago vazio e do incômodo que isso causava.
Não existe motivação para algo assim. Não é tão simples como "confessou que foi vingança". “Foi vingança” não esclarece a maldade humana, não explica como não conseguimos nos antecipar a ela, não explica como não percebemos, não explica como não olhamos, não explica como não conseguimos pensar em nada melhor do que isso.
Como nós que nos achamos mais inteligentes não conseguimos pensar em nada que possa mudar isso? Como podemos viver em um mundo deste e ainda nos divertir?
Temos que pensar em alguma coisa, pois a vingança não explica nada para mim. Uma pessoa dessas não tem nem condições de saber o que é vingança. Bom se tivesse sido vingança, bom se isso fosse explicável, bom se tivéssemos uma doença mental para justificar algo assim. Mas não temos! Se criamos um animal insensível e indiferente, perdemos para esse animal. Se criamos um homem orgulhoso demais para roubar, abandonar seus filhos ou os impor um sofrimento lento e profundo, perdemos para nós mesmos. Viver em uma sociedade onde isso ocorre é uma tragédia. O crime é mesmo a tragédia humana.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Delegado Rafael Vianna profere palestra no NPSPP da Universidade Tuiuti


Na abertura do "III Seminário Nacional do Núcleo de Pesquisa em Segurança Pública e Privada (NPSPP), da Universidade Tuiuti do Paraná/Cursos de Pós-graduação e Extensão nas áreas de Segurança, Direito e Educação, o Delegado Rafael Vianna proferiu a conferência "Direito e Segurança Pública: uma visão multidisciplinar", junto com o Delegado de Polícia Federal e Doutor em Direito Carlos Roberto Bacila.
Aproximadamente 400 pessoas assistiram ao evento.
 

O Núcleo de Pesquisa em Segurança Pública e Privada da UTP - além da realização de seminários, conferências e mesas de discussão - oferece diversos cursos de pós-graduação e de extensão (http://npspp.utp.br/).