quinta-feira, 28 de março de 2013

HOJE EU MATEI!

Faz 10 dias que chove sem parar em Curitiba. O sol não aparece mais. As pessoas estão mais tristes, mais quietas, mais angustiadas. O clima parece afetar o espírito humano. Curitiba não é das cidades mais fáceis para se viver. O frio acompanha a chuva nestes últimos dias e parece que nunca mais teremos um dia de sol e de calor por estas terras.
Mas as piores tempestades passam e um dia o sol voltará a aparecer. Por isso tento não me entregar ao desânimo dos dias cinzentos e saio de casa sempre que posso. Hoje foi assim. Não era dia de trabalho e sai para almoçar tarde, com frio de nove graus e chuva incessante. Não tinha compromisso com ninguém, horário para nada, mas não tive tempo para as pessoas, como todos nós na maioria das vezes.
Quando estava no carro a caminho do restaurante, passando pela rua já um pouco alagada, avistei um velho maltrapilho, imundo, encharcado pela chuva, tremendo de frio e remexendo uma lata de lixo atrás de comida. Olhei! Vi! Enxerguei! Não tenho como negar que o vi. Eu o vi, mas não parei, não fiz nada, não mudei meus planos de almoçar em um lugar quente, seco e aconchegante.
Tive um impulso de ajudar, é verdade, mas logo me contive, pois não posso salvar o mundo, não faria diferença alguma, teria muito trabalho, teria que mudar meus planos, ele estava muito molhado, barbudo, fedido… Também não saberia o que fazer com ele. Levaria para casa? Pagaria um hotel? Levaria para um abrigo? Daria um prato de comida? O que eu poderia fazer?
Não sei. A maioria não saberia. Eu estou perdoado. Afinal de contas, teria muito trabalho para salvar uma vida, para ajudar uma pessoa. Então minha mente criou as mesmas desculpas que criamos todos os dias para não fazer nada e aceitar a covardia, a passividade, a perversidade.
Eu vi e não fiz nada, como a maioria de nós na maioria das vezes. Enxergamos e não fazemos nada, pois estamos ocupados demais e não faria diferença no mundo. Eu também o matei. O matei de fome, de frio, de egoísmo, de indiferença. Tentarei não conter meus impulsos da próxima vez. Esse já foi.
Por Rafael F. Vianna
Publicado no Jornal do Ônibus, no Jornal Correio Paranaense e no Jornal de Colombo.

sábado, 23 de março de 2013

Delegado Rafael Vianna participa de treinamento em Lima, no Peru

Neste mês de março, o Delegado Rafael Vianna participou de um curso sobre tática e sobrevivência policial na Academia Internacional de Segurança Pública (Internacional Law Enforcement Academy), entidade idealizada e mantida pelo Departamento de Estado Americano (US Departament of State), em Lima, no Peru.
Durante o curso, como vencedor de um torneio de tiro policial, o Rafael Vianna foi premiado com uma medalha dos agentes especiais do DEA que foram treinados para atuar no Afeganistão.

O site da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná divulgou notícia sobre a participação de policiais da Assessoria Civil no curso:

19/03/2013
Policiais da Assessoria Civil da Sesp participam de treinamento no Peru

O delegado Rafael Vianna e o investigador Ângelo Ramires, da Assessoria Civil da Secretaria da Segurança Pública, participaram de uma semana de treinamentos realizada pelo Departamento de Estado Americano em Lima, no Peru, para representantes de cinco países (Chile, Peru, Equador e Colômbia, além do Brasil).
Realizado pela International Law Enforcement Academy Latin America, mantida pelo Estado norte-americano, o treinamento incluiu aulas teóricas e práticas de táticas policiais, técnicas de lutas e defesa pessoal, combate em ambiente fechado, técnicas de abordagem, sobrevivência e combate urbanos, tendo como instrutores agentes especiais do Drug Enforcement Agency (DEA).
“Esta foi uma oportunidade de intercâmbio entre polícias de diversos países, o que serve tanto para aprimorar a técnica policial quanto para conhecer a forma de gestão na área da segurança pública de outros países”, afirmou o assessor civil da Sesp.
Os 35 policiais participantes também disputaram um torneio de tiro policial, do qual Vianna foi o vencedor, recebendo como prêmio uma medalha concedida aos agentes especiais que serviram no Afeganistão.



domingo, 17 de março de 2013

AS TRÊS GRANDES ÁREAS PARA SE PENSAR A SEGURANÇA PÚBLICA E A PREVENÇÃO DA CRIMINALIDADE

Tudo que se fala sobre segurança pública parece desconexo e sem um lugar definido para entendermos onde o Estado está atuando, onde o cidadão pode contribuir e como chegaremos a algum resultado.
Tentando diminuir a complexidade do tema segurança pública e criminalidade, o que é essencial para a boa compreensão de todos e a possibilidade de se pensar o que temos, onde queremos chegar e como faremos isso, costumo dividir a solução da segurança pública em três grandes áreas.
Acredito ser essencial esclarecer esta divisão didática agora, pois em artigos passados apresentei sugestões que transitavam entre as três áreas, mas não as explicitei, parecendo para o leitor inicial, não familiarizado com a área da segurança pública, que ela é uma complexa colcha de retalhos sem saída.
Pois bem. A primeira grande área trata das questões de fundo, as mais importantes, que dizem respeito às causas da criminalidade e da ineficiência da segurança pública. As questões dessa área só podem ser resolvidas a longo prazo, mas são as que necessitam de medidas imediatas e permanentes. Apenas tratando dessas questões podemos parar de enxugar gelo, de querer resultados diferentes fazendo sempre as mesmas coisas e de nos enganarmos de que teremos algo melhor no futuro.
Nessa área estão localizadas questões como por que as pessoas consomem drogas, reflexões sobre qual o sentido e quais os valores que queremos dar para a vida em sociedade e propostas de soluções como o planejamento familiar. Aliás, talvez essa seja a medida mais importante para a segurança pública a longo prazo. Nesta área o Estado tem alguma atuação, mas geralmente com campanhas educacionais e diretrizes. O grande papel nessas medidas é realizado pela própria sociedade, pelas famílias e agrupamentos sociais.
Somos nós que mudamos a nossa cultura, os nossos valores, as nossas visões de mundo. Não queremos que apenas um grupo de pessoas nos digam como devemos viver, o que devemos pensar, no que devemos acreditar. Temos que construir o nosso mundo, os nossos valores, a nossa cultura, o nosso sentido, as nossas razões.
Por Rafael F. Vianna
Publicado no Jornal do Ônibus, no Jornal Correio Paranaense e no Jornal de Colombo.

quarta-feira, 13 de março de 2013

NADA FUNCIONA EM SEGURANÇA PÚBLICA?

Robert Martinson - estudioso das políticas criminais e de segurança pública e das práticas penais - já nos anos 70 afirmou que em segurança pública e em políticas criminais nada funciona (nothing works).
E hoje, quando pensamos sobre a nossa segurança pública, o nosso sistema penitenciário, as nossas políticas criminais e o nosso Estado, temos exatamente a mesma impressão: que nada funciona. É apenas uma questão de observação e encontramos muitas pessoas com boa vontade, homens empenhados em fazer o melhor, políticos que buscam alternativas para melhorar a atual situação. Temos que admitir que existem pessoas de boa vontade no mundo.
Contudo, nada parece ter realmente efeito na melhoria do nosso modo de vida e, especificamente, na segurança pública. Às vezes me pergunto se realmente alguma coisa pode funcionar, pois se contratam mais policias e nada, constrói-se mais presídios e nada, aumentam-se as penas e nada, faz-se um plano novo de segurança e nada. Parece que existe uma contingência inefável em todas as questões relativas ao crime e à segurança pública.
Mas isso não é uma verdade absoluta (se é que essas existem), pois alguma coisa funciona em segurança pública e em políticas criminais, mas não do jeito que queremos. Temos que pensar nas causas, aceitar o tempo para as mudanças, não nos iludir com as medidas. A lógica do absurdo não pode ser usada na nossa sociedade se queremos mudar alguma coisa. Ou, como já disse, aceitamos que não queremos mudar nada. Talvez alguns até aceitem isso. Eu ainda não consigo aceitar, apesar de algumas vezes ter a sensação de estarmos enxugando um iceberg nos pólos da terra.
O principal obstáculo de se iniciar mudanças estruturais é que todas as medidas são de longo prazo e que não serão sentidas em um ou dois governos ou legislaturas. Outro obstáculo é que tratamos todos os nossos problemas sem lógica alguma em quase todos os momentos. E ainda há o obstáculo de nos escondermos demais do que somos e do que pensamos, de nossas fraquezas, angústias, vergonhas e maldades. O grande problema é que temos obstáculos demais e não conseguimos avistar vantagem pessoal alguma em superá-los. Pensar a sociedade e o Estado não tem sentido, não tem lógica, não tem razão. Ainda assim, alguma coisa tem que funcionar.
Por Rafael F. Vianna
Publicado no Jornal do Ônibus, no Jornal Correio Paranaense e no Jornal de Colombo.

sábado, 9 de março de 2013

A LÓGICA DO ABSURDO CONTINUA

Como podemos pensar em um mundo sem guerras se estimulamos as indústrias armamentistas? Como achamos que os homicídios vão diminuir se as fabricantes de armas continuam a inundar o mercado com armas e mais armas? Como podemos imaginar acabar com os crimes violentos se estimulamos o lucro acima de tudo, valorizamos mais o ter do que as pessoas e admiramos a violência e a guerra?
Como achamos que as consciências mudarão se quase toda propaganda é irracional e feita para corromper? Como melhorar o nosso mundo se estimulamos sempre em nossa economia o que nos mata, o que nos faz mal, o que nos leva de nós? Como achar que consciências são modificadas por propaganda e economia? Como não achar?
Armas existem para matar. Guerras existem para subjugar. Carros velozes existem para correr. Indústrias de armas para produzir armas e indústrias de carros para produzirem carros. É contraditório estimular as indústrias de veículos porque elas geram empregos, mas tentar diminuir o número de carros nas ruas com rodízios, multas ou tarifas. Não se pode almejar os lucros das guerras, o estímulo que ela dá para a economia, o avanço tecnológico que possibilita; sem os efeitos de mortos e feridos. Se paga um preço para tudo.
Quando escolhermos diminuir o número de carros nas ruas, perderemos grande parte dos empregos que empresas automotivas geram; quando escolhermos a paz, abriremos mão dos lucros da guerra; quando escolhermos a bondade, aceitaremos as privações de nossos instintos mais primitivos na maioria das situações. As indústrias bélicas no mundo existem para a guerra e enquanto elas forem estimuladas, financiarem campanhas, gerarem lucros inimagináveis, continuaremos a ter guerras no mundo. Caso contrário, a economia mundial quebra, os políticos não se reelegem, nossos filhos perdem os empregos. Talvez precisemos começar a pensar em transformar a base de nossa economia para resolvermos alguns problemas.
A mesma coisa é ficar prendendo pessoas, construindo presídios e acreditando que com isso irá se diminuir a criminalidade. O contingente de futuros criminosos não para de crescer (e cresce em progressão geométrica); enquanto a construção de presídios e a contratação de policiais nunca conseguirá atingir os mesmos níveis. Até quando construiremos presídios?
Por Rafael F. Vianna
Publicado no Jornal do Ônibus, no Jornal Correio Paranaense e no Jornal de Colombo.

quinta-feira, 7 de março de 2013

A LÓGICA DO ABSURDO EM NOSSA SOCIEDADE

Tratamos de todos os nossos problemas sem qualquer lógica e achamos que vamos resolver alguma coisa. Sempre tentamos resolver os problemas de cima para abaixo, achando que combatendo os sintomas acabamos com a causa. Da mesma forma, adotamos ações antagônicas e incompatíveis, achando que elas se encaixarão em algum momento ou que deixarão de gerar seus efeitos naturais.
Geralmente agimos assim em nossa vida e com nossos problemas pessoais, mas também agimos assim em nosso trabalho e em nossa sociedade, quando pensamos como será o nosso Estado. É por isso que tudo é tão difícil de funcionar. Quando não conseguimos entender as causas dos problemas, pensamos em remediar os efeitos que nos incomodam, mesmo que um dia as causas nos matem.
Um exemplo? Tenho vários. A obrigatoriedade de passar de ano esconde o problema da falta de nutrição na primeira infância e as condições ruins de estímulo e ensino nos primeiros anos de estudo. O discurso das drogas como razão de todos os males esconde o problema de não sabermos as causas da criminalidade e não conseguirmos explicar a eterna ausência de sentido da vida. Reclama-se do problema do caos no trânsito, mas toda nossa economia é baseada nas indústrias automotivas e no estímulo ao consumo de veículos. Reduzem-se os impostos para a compra de veículos, mas nos iludimos que um dia os engarrafamentos diminuirão, o transporte caótico melhorará e a poluição nas cidades diminuirá.
Como se pode produzir carros cada vez mais potentes e que atingem maior velocidade em menos tempo, mas se proibir e tentar limitar as altas velocidades? Se desejam que nós não andemos rápido, por que criam carros de passeio que atingem 300 Km/h? Depois querem nos multar, mas diminuem impostos para comprarmos mais e mais carros, cada vez mais e mais velozes. Aí almejam melhorar o trânsito e diminuir a poluição. Mas fazem nossa economia mais e mais refém da produção de carros. Algo não tem lógica em tudo isso. Acho melhor assumirmos que não queremos resolver nem melhorar nada. Carros velozes existem para correr. Indústrias e montadoras de veículos existem para colocar carros nas ruas!
Por Rafael F. Vianna
Publicado no Jornal do Ônibus, no Jornal Correio Paranaense e no Jornal de Colombo.

domingo, 3 de março de 2013

PARA SER POLICIAL

Para ser policial você precisa ser curioso! Porque ser policial é filosofia, é dúvida, são certezas, reflexões, é medo, coragem, alegrias e tristezas. Ser policial é lutar pela justiça e se indignar com as injustiças, é aprender e se surpreender todos os dias; é conhecer o que há de pior e de melhor no ser humano.
Ser policial é se ver todos os dias diante de conflitos de deveres, é se defrontar com questões existenciais, é pensar e duvidar que alguma justiça é possível, é chorar diante da escolha do mal menor.
Ser policial não é apenas prender o homem mau, ainda que o seja, mas é aprender que nem sempre se prende o homem mau. Para ser policial é preciso ter boa vontade, pois só ela te faz continuar quando não há mais esperança. Ser policial é comprometer-se sem necessidade, servir quando poucos continuariam, conhecer uma satisfação que nenhuma outra profissão possibilita. Só o policial sabe o prazer de impedir uma injustiça, de salvar uma vida, de fazer com que o algoz não prevaleça diante de um pai de família.
Ser policial é se chocar com a tragédia humana e aprender que a segurança pública é uma das áreas mais complexas do conhecimento. Ser policial é resistir.
Desejo sinceramente que os bons policiais resistam, que a Polícia Civil resista, que não generalizem, não confundam, não cometam injustiças. Que tudo que vem ocorrendo não sirva para desejos ou vinganças pessoais, mas que no final tenhamos uma sociedade que compreenda melhor a polícia e que dela se aproxime para refletir sobre os problemas e as possíveis soluções para a segurança pública.
Espero que os bons policiais civis resistam, pois somos nós a única ponte entre a civilização e o submundo que a maioria não quer ver. Que resistam, pois quando a informação tiver horário e local para ser obtida, ficaremos reféns do submundo e de suas regras. Espero que os policiais que sempre estiveram prontos para atender um chamado (não importando o horário, o dia da semana ou as horas obrigatórias que já tinham sido ultrapassadas), não desliguem seus telefones, não cumpram tão somente seus expedientes, não deixem de buscar informações quando conversarem com as pessoas.
Há muita coisa para ser arrumada, mas não encontramos a origem de todo mal no mundo.
Por Rafal F. Vianna
Publicado no Jornal do Ônibus, no Jornal Correio Paranaense e no Jornal de Colombo.